domingo, 27 de dezembro de 2009
Possibilidades
No último domingo, Carol acordou bem cedo. Costume em nosso segundo ano de casamento. Desde que eu disse a ela para não comer tanto bolo de chocolate. Não importava frio, chuva, nem feriado. Foi correr. Não havia notado que ela estava mais magra, nem o quanto estava mais bonita. No primeiro ano, aos domingos, ficávamos de preguiça na cama, entre uma transa e outra. Ou será que o novo hábito começou no dia em que ela veio carinhosa provocar-me, eu resmunguei, virei para o lado e continuei a dormir. Ela não ousou mais. Não, não. O novo hábito começou quanto íamos ao aniversário de mamãe e eu disse a ela que aquele vestido ficava melhor um pouquinho mais folgado. Hummm... Acho que pode ter sido quando eu disse que era melhor a bermuda ao short. O maiô ao biquini. Passou a correr todos os dias. E eu que não acordo muito cedo, nem a via sair. Dia nenhum. Aos poucos sexo já não era rotina. Mudou para a situação de vez em quando. Também não tiro minha parcela de culpa. Problemas no trabalho fizeram com eu chegasse em casa silencioso. Cheio de grilos na cabeça. Deveria ter aproveitado o lar para relaxar. Mas não, remoía os pepinos e abacaxis, silencioso. E quando eu estava afim de descontrair-me, a saída com os amigos era indispensável. E ela foi ficando. Segundo plano. Terceiro plano. Ela respeitou a minha decisão. Também foi viver sua vida. Fez um novo curso. Conheceu novas pessoas. Escreveu uma peça de teatro. A estréia havia sido na noite da sexta anterior. Sucesso total. Com direito a foto no jornal e elogios. Só não fui convidado porque anunciei logo que já tinha compromisso quando ela perguntou se no sábado eu sairia novamente. De bate-pronto respondi que tinha. Afinal, não poderia deixar mulher querer me regular. Besta quadrada. Esqueci-me por completo que casei-me com uma mulher especial. Nunca pegou no meu pé. Quando li no jornal a matéria sobre a peça ainda fui tirar satisfação. Não me convidou. Nem eu dei chance ao convite. Para piorar o momento, tentei fazer-me de arrependido, contei as conversas da noite e minha dedução de que uma das minhas amigas deveria trocar o namorado e encontrar um cara bacana. Tal como você? Ouvi ela dizer rindo e eu respondi envaidecido. Sim. Então vá em frente, conquiste-a! Ouvi atônito a última parte. Desculpa, eu não entendi. O tempo passou e nós não o vivemos juntos. Vidas com novos rumos! É o título de sua nova peça?! Eu acho que está na hora de darmos novos rumos às nossas vidas, separá-las... Como assim, separação? Sim. Por quê, nos damos tão bem? Nunca brigamos. Foi quando ela mirou os meus olhos. Realmente nunca brigamos. Acho que este é o problema. Onde crescia o desejo, botrou apenas o companheirismo. Ganhou corpo. Expandiu. Tomou todo o espaço. Eu ainda quero a paixão sempre. Inutilmente, passei o dia inteiro tentando seduzi-la. Ela se limitava a dizer que não precisava, afinal, só estava fazendo tudo aquilo depois de nossa conversa. Provável que se a conversa não tivesse acontecido, tudo estaria na mesma.
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